domingo, 29 de junho de 2008

Sussurros
(em estado de perfeição)

Entre um sussurro e outro:

o ar em gotas,
a alma em chamas,
os montes negros,
a voz da cama,
o beijo alado,
peito calado
e as bocas clamando.

Salivando,
salivando...

entre um sussurro e outro.


Maria Maria

sexta-feira, 27 de junho de 2008

HAICAIS (POR ADOCÃO)
OU PSEUDOS


Ventre

Ui (!)
Fechei a porta
do meu ventre.


Cone

O teu cone cilíndrico,
arredondado faz–me
louca no teu cavalo alado.

A língua

A língua é um lençol
de seda que deita
e rola no meu desejo.


Lua

Embora seja tua
dê-me nua
a lua que te dei.

Zeus

São meus os teus
olhares que os trovões
apagarão.

Fome

Se a poesia me toma
e me deseja, é porque
sou fruta na tua mesa.

Deusa

Se deusa me tomas,
me usa! Mas bebes tu
o mel que te lambuza.


Maria Maria

terça-feira, 24 de junho de 2008


Retalhos

Linha e agulha:
sinto-me!

Costuro-me, cozinho-me
em zigue-zague.

Sou o próprio retalho,
a emenda, a trama.

Sou a cama, o lençol,
a fronha.

Sou a cocha e o traço:
sinto-me!


Maria Maria

sábado, 21 de junho de 2008

Dor do deserto

Meu chão reclama
a dor do deserto.
Mas não sou o deserto
dessa areia. Ou sou?

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Não abrace.
Não beije.
Não force a entrada.
Destorça na investida os sobressaltos.
Pense bem antes de usar!
Meu coração
não aceita devolução.

Poema de Renato de Melo Medeiros, poeta do vale do Assu.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Delírio ao amanhecer

Meus seios acordaram meninos.
Tão ausentes de sua essência,
involumosos,
tímidos,
miúdos.

Meus seios
(antes abóbada)
estavam virgens
de outras mãos,
olhares, desejos...

À noite
(quando a lua despertar)
meus seios tornar-se-ão
chumaço de puro algodão
e massa firme em delírio.

Maria Maria

sexta-feira, 6 de junho de 2008


Personificação

Meu marido acordou
meio gato:

tomou banho de língua,
bebeu leite no prato
e depois lambeu o tacho.

Pensei ser bobagem
acordar-se bem assim.

E eu, com certa delicadeza,
levei dentro da bandeja
meu ratinho de cetim.

Maria Maria

terça-feira, 3 de junho de 2008


Ignorância

Quando abro os olhos,
a dor me parece maior.
Então percebo em desalento
que o escuro, às vezes, é límpido
como o algodão.

Logo, abraço o sol
tal qual as janelas
no alvorecer do dia,
no ermo pardo do Seridó.
E vejo sonolenta:

A ignorância me dói menos.
E penso seriamente
em rasgar meus livros
e meus pensamentos ingênuos.
Penso, mas não o faço!


Maria Maria